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terça-feira, 14 de junho de 2016

É tão ruim ser surdo?

Para aquele que não ouve, entender a surdez como problema é resultado de uma construção do mundo ouvinte, que tem dificuldade em aceitar as diferenças em vários níveis. Como pode alguém viver sem ouvir? Como essa pessoa se sente? O que pensa? O que sonha? Como consegue se comunicar? Esses são as perguntas mais comuns de pessoas ouvintes por estereotipo, ou seja, o individuo surdo é visto como incapaz de se desenvolver em alguns aspectos, especialmente com a linguagem e aprendizagem.
A língua Brasileira de Sinais (Libras), tão defendida e usada nas comunidades e culturais surdas do Brasil todo, pode ser extrema importância para os surdos, em especial quando entram na adolescência e buscam autonomia, conhecem pessoas na mesma situação, que experienciam o mundo principalmente de forma visual. Por meio desse encontro é possível estabelecer identificações e pensar sobre as dificuldades presentes na cultura de qualquer minoria, sem o rótulo da desvantagem, da incapacidade e do déficit que precisa ser corrigido. Com o Bilinguismo ( Libras e Português), o surdo é capaz de transitar entre duas culturas diferentes e ter acesso ao que pertence á cultura geral, com a leitura e a escrita do português, e é por isso, que ele é essencial.
Questionando então, a surdez é um problema para o surdo? Talvez, depende da forma que conceber a surdez – patologia ou outra cultura? A tentativa de adaptar o surdo, enquadrando-o nos moldes “ouvintistas” ( conjunto de representações dos ouvintes, obrigando-o a olhar-se e narrar-se como se fosse ouvinte), mostraria, a fragilidade que temos para lidar com o desconhecido e o diferente.
A mudança de visão sobre a surdez passa pelo seu reconhecimento como diferença, um reconhecimento politico que tem consequências em todas as esferas da vida dos surdos. Se essas pessoas tivessem acesso a uma língua que não dependa do recurso da audição, os estigmas e os problemas apontados nela não aparecem mais, o que significa que são produzidos por condições sociais.
Quando tratamos da constituição do sujeito pela linguagem, não há muitas diferenças entre ouvinte e surdos. Apesar de que não ouvirem, os surdos também são “falados pelos outros” que cuida deles, sofrem o efeitos dessa fala e também entram na mesma estrutura de linguagem que os ouvintes, já que a estrutura simbólica é uma só. O que muda é que o surdo usa outras formas, geralmente o visual, diferentemente do ouvinte.
Não é falta de audição e de fala que impedirá que isso ocorra, e sim o modo com o adulto lerá, interpretará e falará com o bebê surdo, a partir de suas representações sobre a surdez, a vida, a infância, a sociedade, e assim por diante. É pela recepção que lhe reserva o adulto cuidador que a surdez orgânica será vista negativa ou positivamente pelo surdo.
                A cultura, a linguagem e o diálogo são fatores essenciais para o desenvolvimento do individuo. É justamente esta é a área comprometida no surdo. A conclusão é que as consequências da surdez ultrapassam as dificuldades comunicativas e atinge todas as áreas do desenvolvimento. Por isso, reconhecer o surdo em todas as suas potencialidades é fundamental. O desenvolvimento linguístico e a aprendizagem de uma língua são fundamentais para a formação da cognição. Embora a criança surda se depare com muitas dificuldades devido aos aspectos do desenvolvimento linguístico, suas potencialidades de desenvolvimento de estruturas e funções cognitivas são as mesmas que as das crianças ouvintes.
Como vimos, é importante para o desenvolvimento global da criança surda que ela tenha cesso a língua de sinais no ambiente social que ela vive, especialmente ambiente familiar e também escolar. Como a maioria das crianças surdas nasce em famílias de pais e irmãos ouvintes, muitas vezes existe a ausência de compromissos quanto á atenção sobre o desenvolvimento linguístico dessa criança na modalidade da língua de sinais. Essa ausência de compromisso é evidenciada justamente pela criança ter acesso natural á língua de sinais da qual ela tem possibilidades de adquirir.
Por fim, os surdos são indivíduos semelhantes a qualquer outro, com características pessoais, apenas portadores de uma surdez. A experiência da surdez lhes permite perceber o mundo de forma diferenciada através do sentido visual. Essa percepção diferenciada cria uma cultura especifica com “códigos” próprios, formas de organização, de solidariedade, de linguagem, de juízos de valores, de arte, distintas da cultura abrangente da sociedade onde a maioria é de ouvinte.


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