Para
aquele que não ouve, entender a surdez como problema é resultado de uma
construção do mundo ouvinte, que tem dificuldade em aceitar as diferenças em
vários níveis. Como pode alguém viver sem ouvir? Como essa pessoa se sente? O
que pensa? O que sonha? Como consegue se comunicar? Esses são as perguntas mais
comuns de pessoas ouvintes por estereotipo, ou seja, o individuo surdo é visto
como incapaz de se desenvolver em alguns aspectos, especialmente com a
linguagem e aprendizagem.
A
língua Brasileira de Sinais (Libras), tão defendida e usada nas comunidades e
culturais surdas do Brasil todo, pode ser extrema importância para os surdos,
em especial quando entram na adolescência e buscam autonomia, conhecem pessoas
na mesma situação, que experienciam o mundo principalmente de forma visual. Por
meio desse encontro é possível estabelecer identificações e pensar sobre as
dificuldades presentes na cultura de qualquer minoria, sem o rótulo da
desvantagem, da incapacidade e do déficit que precisa ser corrigido. Com o
Bilinguismo ( Libras e Português), o surdo é capaz de transitar entre duas
culturas diferentes e ter acesso ao que pertence á cultura geral, com a leitura
e a escrita do português, e é por isso, que ele é essencial.
Questionando
então, a surdez é um problema para o surdo? Talvez, depende da forma que
conceber a surdez – patologia ou outra cultura? A tentativa de adaptar o surdo,
enquadrando-o nos moldes “ouvintistas” ( conjunto de representações dos
ouvintes, obrigando-o a olhar-se e narrar-se como se fosse ouvinte), mostraria,
a fragilidade que temos para lidar com o desconhecido e o diferente.
A
mudança de visão sobre a surdez passa pelo seu reconhecimento como diferença,
um reconhecimento politico que tem consequências em todas as esferas da vida
dos surdos. Se essas pessoas tivessem acesso a uma língua que não dependa do
recurso da audição, os estigmas e os problemas apontados nela não aparecem
mais, o que significa que são produzidos por condições sociais.
Quando
tratamos da constituição do sujeito pela linguagem, não há muitas diferenças
entre ouvinte e surdos. Apesar de que não ouvirem, os surdos também são
“falados pelos outros” que cuida deles, sofrem o efeitos dessa fala e também
entram na mesma estrutura de linguagem que os ouvintes, já que a estrutura
simbólica é uma só. O que muda é que o surdo usa outras formas, geralmente o
visual, diferentemente do ouvinte.
Não é
falta de audição e de fala que impedirá que isso ocorra, e sim o modo com o
adulto lerá, interpretará e falará com o bebê surdo, a partir de suas
representações sobre a surdez, a vida, a infância, a sociedade, e assim por
diante. É pela recepção que lhe reserva o adulto cuidador que a surdez orgânica
será vista negativa ou positivamente pelo surdo.
A cultura, a
linguagem e o diálogo são fatores essenciais para o desenvolvimento do
individuo. É justamente esta é a área comprometida no surdo. A conclusão é que
as consequências da surdez ultrapassam as dificuldades comunicativas e atinge
todas as áreas do desenvolvimento. Por isso, reconhecer o surdo em todas as
suas potencialidades é fundamental. O desenvolvimento linguístico e a
aprendizagem de uma língua são fundamentais para a formação da cognição. Embora
a criança surda se depare com muitas dificuldades devido aos aspectos do
desenvolvimento linguístico, suas potencialidades de desenvolvimento de
estruturas e funções cognitivas são as mesmas que as das crianças ouvintes.
Como
vimos, é importante para o desenvolvimento global da criança surda que ela
tenha cesso a língua de sinais no ambiente social que ela vive, especialmente
ambiente familiar e também escolar. Como a maioria das crianças surdas nasce em
famílias de pais e irmãos ouvintes, muitas vezes existe a ausência de
compromissos quanto á atenção sobre o desenvolvimento linguístico dessa criança
na modalidade da língua de sinais. Essa ausência de compromisso é evidenciada
justamente pela criança ter acesso natural á língua de sinais da qual ela tem
possibilidades de adquirir.
Por
fim, os surdos são indivíduos semelhantes a qualquer outro, com características
pessoais, apenas portadores de uma surdez. A experiência da surdez lhes permite
perceber o mundo de forma diferenciada através do sentido visual. Essa
percepção diferenciada cria uma cultura especifica com “códigos” próprios,
formas de organização, de solidariedade, de linguagem, de juízos de valores, de
arte, distintas da cultura abrangente da sociedade onde a maioria é de ouvinte.
Nenhum comentário:
Postar um comentário